quarta-feira, 23 de março de 2011

Como trabalhar as relações raciais na pré-escola

Mostrar a importância de respeitar as diferenças é uma lição que deve ser ensinada desde os primeiros anos de escolaridade

Débora Menezes

Toque no cabelo e a representação das sensações com massinha

Em Campinas, interior de São Paulo, a professora Elaine Cassan também usou histórias para dar uma abordagem pedagógica ao tema etnia na EMEI Iniciação Pezinhos Descalços. Tudo começou com uma brincadeira sutil: deixar as crianças experimentarem o toque, nos cabelos umas das outras, para perceber que nem todo mundo é igual.
Em seguida, elas representaram essas sensações em bonecos de massinha. "Tanto o toque como a massa de modelar têm o objetivo de experimentar um contato prazeroso com o outro", explica Elaine. No ano passado, a professora Renata Esmi Laureano deu continuidade ao trabalho, que incluiu a produção de um "álbum da diversidade", com desenhos e colagens de fotos e gravuras com pessoas de todos os jeitos e gêneros. Os pais também participaram, resgatando fotografias de antepassados para que as crianças pudessem fazer uma árvore genealógica, descobrindo sua identidade familiar. Tudo para valorizar a individualidade e a história de cada um.
Contos e filmes, como o desenho animado Kiriku e a Feiticeira, também foram mostrados para a garotada conhecer histórias de origem africana. As duas professoras compartilharam informações e reflexões com os colegas e promoveram até uma sessão só com intervalos de um canal de TV para as crianças mais velhas observarem os tipos físicos que aparecem nas propagandas. "Assim, pudemos reconhecer com eles as diferenças e abordar a questão do preconceito de forma crítica", lembra Renata.
Glossário
Antes de propor ações positivas para a questão racial, é importante entender o significado exato de três conceitos fundamentais para trabalhar corretamente o tema.
Preconceito
Alguém age com preconceito quando faz um prejulgamento ou tem uma ideia preconcebida, sem razão objetiva, a respeito de um indivíduo ou de um povo. É preconceituoso quem diz que "os negros (ou os índios) não gostam de estudar".

Discriminação
A discriminação ocorre quando os preconceitos são exteriorizados em atitudes ou ações que violam os direitos das pessoas com base em critérios injustos (que podem ser não só de raça mas de sexo, idade e religião, entre outros).

Racismo
O racismo é definido como "o comportamento hostil e de menosprezo em relação a pessoas cujas características intelectuais ou morais são consideradas inferiores por outros que se consideram superiores". Pesquisadores que estudam o assunto acreditam que o conceito atual de racismo surgiu no século 18 para justificar a dominação do branco europeu sobre os povos de outros continentes.

Fonte: Programa São Paulo - Educando pela Diferença para a Igualdade (Neab/UFSCar)

Sugestão de atividades para combater o preconceito
Lucimar Rosa Dias, especialista em Educação e relações raciais, doutoranda em Educação pela Universidade de São Paulo e membro da Comissão Técnica Nacional de Diversidade para Assuntos Relacionados à Educação dos Afro-Brasileiros, do Ministério da Educação, e Waldete Tristão Farias Oliveira, coordenadora pedagógica do Centro de Educação Infantil Jardim Panamericano e formadora de professores, sugerem as seguintes atividades para promover ações afirmativas e combater o preconceito e a discriminação em sala de aula.

RODAS DE CONVERSA

Reunir os pequenos em uma roda abre espaço para conhecê-los melhor. Para entender as relações de preconceito e identidade, vale a pena apresentar revistas, jornais e livros para que as crianças se reconheçam (ou não) no material exposto. A roda é o lugar de propor projetos, discutir problemas e encontrar soluções. Também é o melhor espaço para debater os conflitos gerados por preconceitos quando eles ocorrerem. Nessa hora, não tema a conversa franca e o diálogo aberto.

VÍDEOS E CONTOS

A contação de histórias merece lugar de destaque na sala de aula. Ela é o veículo com o qual as crianças podem entrar em contato com um universo de lendas e mitos e enriquecer o repertório. Textos e imagens que valorizam o respeito às diferenças são sempre muito bem-vindos.

BONECOS NEGROS

As crianças criam laços com esses brinquedos e se reconhecem. É interessante associar esses bonecos ao cotidiano da escola e das próprias crianças, que podem se revezar para levá-los para casa. A presença de bonecos negros é sinal de que a escola reconhece a diversidade da sociedade brasileira. Caso não encontre bonecos industrializados, uma boa saída é confeccioná-los com a ajuda de familiares.

TOQUE

Mexer nos cabelos e trocar pequenos carinhos é uma forma de cuidar das crianças e romper possíveis barreiras de preconceitos. O trabalho com o cabelo abre caminho para estudar tamanho, textura, cor e permite aprender que não existe cabelo ruim, só estilos diferentes.

COMIDA

Pesquisar a história de alimentos de origem africana é um jeito de valorizar a cultura dos afro-descendentes. Melhor ainda se houver degustação, com o apoio da comunidade. As aulas de culinária são momentos ricos para enfocar as heranças culturais dos vários grupos que compõem a sociedade brasileira.

MÚSICA E ARTES PLÁSTICAS

A música desenvolve o senso crítico e prepara as crianças para outras atividades. Conhecer músicas em diferentes línguas, e de diferentes origens, é um bom caminho para estimular o respeito pelos diversos grupos humanos. E isso se aplica a todas as formas de Arte.
Formação para atender à Lei 10.639, de 2003

A questão racial é conteúdo obrigatório no currículo escolar. A Lei 10.639, de 2003, decretou a inclusão do ensino da História e da cultura afro-brasileiras no Ensino Fundamental e Médio. E a lei passou a valer para todos os níveis da Educação Básica com a instituição das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais.
Para ajudar escolas e professores, a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério da Educação promove cursos de capacitação e distribui material didático sobre o tema. Um desses cursos, em parceria com a Universidade de Brasília, já formou (a distância) cerca de 25 mil professores de escolas públicas de 306 municípios de todo o país no tema Educação e Diversidade Étnico-Raciais.
Além de conhecer a influência africana na formação cultural brasileira, eles receberam informações sobre a questão racial na Educação Infantil, principalmente no que diz respeito à identidade racial.
Os especialistas ressaltam que o objetivo do professor não deve ser desprezar um determinado tipo de cultura ou dizer que uma é melhor do que outra. "Cabe à escola dar oportunidade para todos conhecerem a cultura afro e entenderem que ela faz parte da cultura brasileira", diz Waldete Tristão Farias Oliveira, coordenadora pedagógica do Centro de Educação Infantil Jardim Panamericano e formadora de professores em questões raciais.
Projetos contra o preconceito...
- Valorizam quem se sente menosprezado.
- Estimulam o respeito à diversidade.
- Formam cidadãos preocupados com acoletividade.

Quer saber mais?
Centro Municipal de Educação Infantil Creche Vovô Zezinho, R. do Comércio, s/no, 40010-000, Salvador, BA , tel. (71) 3611-7353
EMEI Iniciação/Pezinhos Descalços, R. José Jorge Filho, 90, 03101-048, Campinas, SP , tel. (19) 3253-6118

INTERNET

Endereço eletrônico do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (Neab) e traz apostilas do Programa São Paulo - Educando pela Diferença para a Igualdade, com diversas sugestões de atividades para sala de aula

Site do
Centro de Estudos das Relações do Trabalho e da Desigualdade, que produz material didático e de apoio para professores trabalharem a questão racial

BIBLIOGRAFIA

Aguemon
, Carolina Cunha, 54 págs., Ed. Martins Fontes, tel. (11) 3241-3677, 30 reais
As Tranças de Bintou, Sylviane Diouf, 32 págs,. Ed. Cosac Naify, tel. (11) 3823-6590, 31 reais
Bruna e a Galinha d'Angola, Gercilga de Almeida, 24 págs., Ed. Pallas, tel. (21) 2270-0186, 21 reais
Educação como Prática da Diferença, Anete Abramowicz, Lucia Maria de Assunção Barbosa e Valter Roberto Silvério, 184 págs., Armazém do Ipê, tel. (19) 3289-5930, 33 reais
Irê Ayô: Mitos Afro-brasileiros, Vanda Machado e Carlos Petrovich, 123 págs., EDUFBA, tel. (71) 3263-6164, 20 reais
Orientações e Ações para a Educação das Relações Étnico-Raciais, org. Ministério da Educação/Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 264 págs., tel. (61) 2104-6183 (distribuição gratuita para escolas)
Trabalhando a Diferença na Educação Infantil, Anete Abramowicz, Valter Roberto Silvério, Fabiana de Oliveira e Gabriela Guarnieri de Campos Tebet, 127 págs., Ed. Moderna, tel. 0800-17-2002, 23,50 reais
Tramas da Cor - Enfrentando o Preconceito no Dia-a-Dia Escolar, Rachel de Oliveira, 121 págs., Ed. Selo Negro/Edições Summus, tel. (11) 3865-9890, 22 reais
Xangô, o Trovão, Reginaldo Prandi, 64 págs., Ed. Cia. das Letrinhas, tel. (11) 3707-3500, 30,50 reais

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